A Travessia da Praia do Cassino é daquelas aventuras boas, que nos fazem perceber que estamos vivinhos e o quanto somos minúsculos perto da imensidão desse Planeta. Para nós, foi sobretudo uma aventura repleta de sentimentos, reflexões e muitos desafios.
O primeiro grande desafio diz respeito a sua extensão. São 230km de faixa de areia contínua dividida em 3 praias (Cassino/Hermenegildo e Barra do Chuí) e já esteve no Guinness book como a maior praia do mundo.
Mas o que torna essa travessia realmente desafiadora, além das condições do “asfalto”, são o isolamento e a vastidão do local. Logo um planejamento minucioso é requisito básico para se aventurar pelas areias da Praia do Cassino.
Esse é o principal motivo de muitos recomendarem que a travessia do Cassino seja feita em grupo (mais de um veículo, moto, bike, a pé etc) para que, caso aconteça algo durante a travessia, tenha alguém para auxiliar ou até mesmo buscar socorro.
Planejamento para a Travessia do Cassino
O planejamento da Travessia do Cassino para nós foi dentro de uma expedição pela América do Sul, e mesmo sabendo da recomendação acima, nós acabamos fazendo sozinhos. MAS EM DEFINITIVO NÓS NÃO RECOMENDAMOS QUE FAÇAM SOZINHOS, e vamos inclusive relatar um caso mais adiante.
Veja também a nossa aventura no YT https://youtu.be/KHjWxeqzM5w
Para fazer a travessia passamos mais de um mês consumindo materiais de diferentes fontes, levantando todos os possíveis desafios de cada trecho e no final ainda fomos presenteados com uma espécie de assessoria dos amigos que fizemos em Pelotas que nos ajudaram a alinhar os últimos detalhes do que estava por vir.
Eles já fizeram a Travessia do Cassino com veículo 4×4 muitas vezes e compartilharam conosco informações extremamente valiosas sobre o desafio.
Aliado a tudo isso Rogerio e eu somos aventureiros por natureza, e temos uma certa experiência em ambientes inóspitos e selvagens como a região do Cassino, logo traçamos planos B, C e D’s para diferentes desafios que pudessem se apresentar ao longo de nossa jornada, sempre respeitando, observando e ouvindo a Natureza, afinal de contas é ela quem manda em lugares como esse.
Inclusive, caso tenha interesse em saber como temos dinheiro para viajar tanto, contamos um pouco nesse Post sobre Planejamento Financeiro.
Chegada e Pernoite em Rio Grande
Na nossa chegada em Rio Grande fomos direto visitar os Molhes da Barra para apreciar essa gigantesca obra de engenharia do nosso país e claro, começar os registros de nossa travessia.
Passamos a noite de domingo (13) pra segunda (14) no Camping Neve Sul, que fica no Cassino. Por ali revisamos os últimos detalhes, compramos mais um pouco de água e alimentos, e abastecemos a nossa viatura, uma Nissan X-Terra carinhosamente apelidada de Brucutu.
Travessia do Cassino – 1º Dia
Cruzamos as areias do Cassino nos dias 14 e 15 de março, (segunda e terça feira), pois eram bons dias de acordo com os sites que usamos para rastrear as condições metereológicas, incluíndo chuvas, ventos e principalmente as marés. Usamos durante o planejamento da Travessia do Cassino os sites Windy, Tidechart e INPE para monitorar essas condições.
Saímos do Camping (que fica do ladinho da praia) por volta das 12h e pensa em 2 crianças, ansiosas pelo que estava por vir, atentos a todos os detalhes e cheios de animação.
Esse foi o tom de nossa travessia e era evidente o quanto estavámos felizes e eufóricos. Foi até engraçado lidar com o conteúdo pós produção pois está nítido nas filmagens a nossa vibe. Veja o vídeo, em breve, aqui.
Logo no início, nem 5 km, já nos sentimos isolados e descemos do carro pra andar, filmar e sorrir. E então pensamos: CARAMBA!! Que legal que nós estamos aqui!!! E o dia que estava meio nublado em questão de minutos ficou lindo e o céu azul nos acompanhou por toda a travessia.
Planejamos o horário de saída para pegarmos a maré baixando, pois com isso a areia fica mais compactada e facilita a dirigibilidade. Deu certo pois não tivemos dificuldade para se locomover em quase nenhum momento do 1º dia, e isso possibilitou que pudessemos parar em diversos trechos com tranquilidade.
Navio Altair
Distânte 22km dos molhes da Barra do Rio Grande fica o Navio Altair. Muitos, inclusive carros 4×2, vão até esse ponto para tirar umas fotos do navio que está sumindo na paisagem.
O Navio está encalhado por ali desde 06 de junho de 1976, quando uma forte tempestade fez com que o comandante optasse por fazer uma varação.
Varação é quando o navio é direcionado propositalmente para um banco de areia para não naufragar em alto mar. Com essa decisão o comandante poupou a vida de mais de 20 tripulantes, embora a investigação do ocorrido tenha considerado a ação do comandante um pouco precipitada.
Se o comandante agiu certo ou errado não cabe a nós julgar, o que importa é que o navio está lá e está sumindo rapidamente pelos efeitos da maresia, então se quiser encontrar o Navio Altair por ali, vá logo.
Seguimos adiante e notamos que o “asfalto” estava bem bom, sendo assim conseguimos manter uma velocidade média de 40km/h em quase todo o 1°dia.
É muito interessante observar como a paisagem se transforma a todo instante devido a presença de elementos dinâmicos. Com isso sugerimos que faça, se possível, em mais de um dia, para poder andar em dunas e apreciar detalhes da paisagem com calma. Isso certamente irá enriquecer ainda mais essa travessia espetacular.
Além disso, com calma é possível apreciar a fauna local e quem sabe encontrar até algum animal marinho vivo, o que infelizmente não foi nosso caso. Mas vimos muitas, muitas, muitas aves.
Farol Sarita
Subimos ainda o drone no Farol Sarita (1°farol da travessia pra quem faz sentido Rio Grande – Chuí) para fazer essa linda imagem aérea.
Nós optamos por fazer a imagem de longe e não fomos exatamente até o local, mas sabemos que o Farol Sarita tem funcionamento automático, logo não tem trabalhadores por ali normalmente.
Farol Verga
Após percorrermos 107km, paramos no ponto que escolhemos para pernoitar. Fizemos um Wild Camping (acampamento selvagem) dentro de uma floresta de pinus, que fica atrás do farol Verga (2° farol).
Antes de realmente decidir dormir por ali fizemos uma exploração pelo local para verificar o quanto era seguro, considerando que somos alvos fáceis caso encontre com alguém mal intencionado. No geral encontramos poucos registros com relação a assalto na travessia, mas infelizmente essa é uma preocupação real então fiquem sempre atentos.
Após o reconhecimento do local recolhemos lenha para uma pequena fogueira, e fizemos um delicioso churrasco regado a vinho para fechar nosso 1° dia de travessia. Dormimos como 2 anjos felizes, satisfeitos, orgulhosos e muito gratos com o decorrer das coisas até aquele momento.
Travessia do Cassino – 2º Dia
Tivemos uma noite tranquila e quando acordamos reunimos nossas coisas, TODO O NOSSO LIXO, e seguimos para o 2° dia da Travessia do Cassino, que sabidamente é mais desafiador.
Tão desafiador que a encrenca começou na saída do farol Verga quando a areia fofa segurava o carro, e eu Camila, não conseguia passar. Mas depois de alguma tentativas, Brucutu, eu e as areias do Cassino nos entendemos e nós saímos dali.
Farol Albardão
Após rodarmos cerca de 20km paramos no 3º Farol. O Albardão foi construído em 1909, e em 1948 ganhou a sua atual torre que tem 44 metros de altura. O Albardão é considerado o farol mais isolado do Brasil e permanentemente funcionários da Marinha administram o local.
É possível visitar o complexo do Albardão e inclusive subir em sua torre. Entretanto a reabertura para visitação após a pandemia tem algumas regras.
Para entrar no Albardão atualmente (2022) é necessário fazer uma solicitação prévia para o Serviço de Sinalização Naútica do Sul. Mas, como não sabíamos disso à época, ficamos só na porta.
De qualquer forma fomos super bem recepcionados pelo funcionário da Marinha do Brasil que, uma vez que não tínhamos a tal autorização, sentiu por não poder nos deixar passar do portão.
Mas além de muito educado ele também nos autorizou um voo de drone a distância :). E mais importante ainda, nos deu a informação acima para que pudessemos compartilhar e ajudar outros viajantes, principalmente àqueles que fazem a Travessia do Cassino a pé.
Não é permitido acampar de carro nas dependências do Farol Albardão, somente pra quem faz a Travessia a pé, inclusive ali é um ponto de apoio fundamental aos andarilhos. Reforçamos que tanto a visitação, bem como a pernoite para os caminhantes no Albardão, somente com a tal autorização prévia. Portanto planeje-se para fazer a Travessia do Cassino com um certa antecedência.
Depósito de lixo nas areias do Cassino
Na sequência do Albardão é onde começa um trecho conhecido como concheiro. Essa região tem aproximadamente 80km de extensão e impõe vários desafios.
Mas antes de falar dos desafios vamos falar da triste realidade do lixo depositado em toda a extensão da Praia do Cassino, especialmente no concheiro.
No concheiro, como implícito no nome, tem um acúmulo gigantesco de conchas que misturado com areia deixa o terreno instável e fofo, todavia isso facilita que objetos e animais mortos fiquem agarrados na areia. E por ali a quantidade é surreal.
Confessamos que foi uma tristeza ver o quão ineficientes somos quando o assunto é gerenciar o nosso próprio lixo, pois a cada passo lá estavam eles deitados na areia da praia, bem como artigos provenientes da pesca desenfreada, poluindo nosso mar e matando diversos animais (vimos muitos animais mortos mas optamos por não publicar as fotos).
Para fazer a nossa parte, uma vez que já estávamos nesse lugar tão inóspito, recolhemos por mais de uma hora objetos provenientes de diversas partes do mundo, tanto para limpar um pouquinho a praia quanto para “brincar” com a questão da procedência daqueles objetos.
A princípio já tínhamos a ideia de sair com umas sacolas de lixo retiradas da Praia do Cassino, mas quando nossos amigos de Pelotas salientaram o quão inusitado são alguns itens encontrados por ali, já fomos preparados também para gravar a “brincadeira”.
Quando não cabia mais lixo no carro seguimos para enfrentar o concheiro e não demorou muito para percebermos como o terreno estáva instável e logo começou a impor outro ritmo a nossa Travessia do Cassino.
Concheiro – Um desafio da Travessia do Cassino
Olhamos para o horizonte e detectamos a presença de um veículo parado relativamente próximo ao mar. Chegando mais perto vimos que era um Motorhome Van Sprinter e que um casal tentava sem sucesso tirar o carro dali.
Eles estavam atolados no concheiro (o 3° atolamento daquele dia), nitidamente exaustos e queimados pelo sol, apresentando até sinais de ligeira desorientação.
Eles também saíram dos Molhes da Barra e cruzaram sem problemas até chegar no concheiro, mas como o carro era inapropriado para aquele terreno, foram obrigados a retornar. Nós os ajudamos por 2 vezes e vimos eles partirem sentido a Rio Grande até perdê-los de vista.
Depois dessa experiência ficamos ainda mais atentos para enfrentar aquele trecho e decidimos não parar mais pra evitar que o carro afundasse na areia. Só que a resistência era tanta que o Brucutu aqueceu e fomos obrigados a parar.
Primeiramente abrimos o capo e fizemos um lanche para aguardar a temperatura baixar. Com a temperatura da água marcando 70°C nós saímos novamente, porém não rodamos nem 10km e o Brucutu novamente apresentou sinais de exaustão.
Paramos novamente e adotamos outra estratégia para sair dali. O Rô foi dar uma volta e viu um “trilho” que estava longe da água, próximo das dunas e optou seguir por ali. Além disso tiraramos o 4x4H pra diminuir o esforço do carro.
E foi assim que o Rô nos tirou dali, com habilidade de condução em areia fofa, com o uso de velocidade constante e da reduzida em alguns trechos, e com muita resiliência e raciocínio rápido para não cairmos em nenhum buraco causados pelos canais de água doce que deságuam no mar e formam verdadeiros barrancos na areia.
Molhes do Chuí – onde acaba o Brasil
Uma vez que pegamos o jeito e saímos enfim do concheiro o desafio era pegar o pôr do sol nos molhes do Chuí. E ele esperou por nós.
Aquelas 2 “crianças” de 230km atrás estavam radiantes, orgulhosas e extremamente gratas pela conclusão dessa travessia que, sem sombra de dúvida, está marcada em nossos corações.
Gostou? Então vamos adorar ler seu comentário e responder a qualquer dúvida especifica sobre a Travessia do Cassino – a maior Praia do Mundo.
Disponível também relatos sobre a Travessia do Cassino nos destaques do nosso Instagram
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